domingo, agosto 05, 2007

Rasgando embrulhos

Ela sabia que não devia, mas não não deu. Era o seu dia, o seu momento.

Sentir aquela pulsação confundir-se com a dela era o que ela precisava para passar pela revolução que viria nos próximos dias. Entre arrependimentos e breve momentos de alegria, a vida flui melhor. E aquelas horas que você sabe que custarão caro depois sempre tem mais valor.

Não foi ela quem escolheu, na verdade já tinha se condicionado a não pensar. O pior é pensar que as circunstâncias nem tão boas sempre andam de mãos dadas com o equívoco. Mas aconteceu. E quando ela disse saber que ele não era seu, apenas estavam juntos naquele dia, ele não disse nada. Então ela entendeu o que isso significava.

Ela lhe falou de um lugar onde sentiriam-se no deserto. Sua gratidão lhe confortou. Partiram em silêncio. Ainda que ele a olhasse pouco, foi nesse lugar onde só os dois viam que ela recebeu dele o seu olhar mais bonito.

Alguns poucos dias depois, o inevitável aconteceu, a anestesia passou e a melhor sinceridade dela não foi o bastante para convencê-lo. Cada palavra calculada e cada frase sistematicamente pensada não mudaram em nada aquele desfecho.

Ela devia ter ensaiado mais, ou quem sabe não ter abusado da sinceridade. O importante é dizer aquilo que precisa ser dito, não o que você realmente quer falar. Outra lição para sua caixinha de vida.

Ainda que ela seja uma idealizadora de riscos calculados, a ilusão lhe trouxe belos momentos. E quando não há mais nada a fazer, você se convence que o importante foi o momento, não a pessoa; e então sai novamente em busca desse momento cujo nome não deseja mais ouvir, e dele não se conforma.

Dia após dia, você se convence da realidade. Ela não quer recordações, não vai (e não pode) tentar de novo. Teve o que devia ter e ponto final. Prefere pensar que foi como o dia de seu aniversário - e a vida também lhe mandara um presente. No final da festa, nós limpamos o salão, guardamos o que ganhamos e então isso tudo não faz mais sentido. O bom mesmo é quando você rasga o embrulho e surpreende-se com o que vê. Depois, é só esperar pelos presentes do próximo ano.

E ela espera.